quinta-feira, 19 de julho de 2012

Coisas que um hétero jamais entenderá - Cap. I

Me lembro de qdo era jovem e de qdo comecei a descobrir minha sexualidade. Era mto novo, talvez 4, 5 anos, não lembro exatamente. Sei que estava na minha antiga escolinha, mas em qual série? Jardim, prézinho? Não sei.

Lembro dos meus amigos, tanto lá como na minha rua. Sempre gostei de me relacionar com as pessoas. Desde pequeno era apenas um garoto sorridente tentando se encaixar no mundo, como todos os outros. Lembro o quão estranho esse mundo parecia para mim, e o quão estranho eu parecia para ele, me sentia de outro planeta. E mtas vezes ainda me sinto.

Com o tempo aprendi a me encaixar. Aprendi a me comportar e fui aprendendo o que era certo do que era errado. Mas de novo, esse mundo me parecia mto estranho. Eu era uma criança mto pensativa e como vivia com mtas pessoas, fui notando suas diferenças, suas ideias.

O mundo foi mostrando sua outra face. Gostava de ver os outros sorrirem. Eu mesmo adorava sorrir, a minha marca era um sorriso. Só que com o tempo, percebi que nem sempre o riso era bom. Fui aprendendo o que eram as chacotas, brincadeiras, zoação. Nada que td mundo não passe, nada que seja tão traumático.

Fui entendendo que certos comportamentos eram inaceitáveis, certos gostos eram inaceitáveis, certos modos de ser. Eu não entendia porque, eu não entendia os motivos de não poder ser assim. E tudo o que eu via me dava mto, mto medo. Eu não queria sofrer como os outros, eu não queria ser como os outros, eu não queria existir. Eu só queria viver e ser amado, aceito. E parecia que daquela forma eu perderia td o que era importante para mim.


Tinha algo diferente, tinha algo estranho ali, em mim. 
Uma das brincadeiras que os meninos mais sofrem é ser chamado de bicha, mulherzinha, mariquinha. Nossa virilidade dever ser mostrada e aplaudida desde cedo. Eu acho que nunca sofri mais que os outros em relação a isso, nunca fui perseguido por isso, trancado no banheiro, ameaçado ou apanhado. Mas já bati, já revidei, já quis mostrar o quão viril eu tb poderia ser. E nunca foi o suficiente.

Não lembro exatamente qdo eu percebi que aquela zoação específica era mais forte para mim. Algo me mobilizava com aquilo, algo era mto angustiante. Era como se colocassem um espelho em minha frente e dissessem para eu olhar uma imagem distorcida. Mas o que estaria assim, a imagem ou eu?

Não sei bem quando percebi que todas as vezes que falavam, faziam essas brincadeiras, sentia-me parte dela. Mesmo não sendo comigo, mesmo eu distante, mesmo se fosse eu quem as iniciasse, incentivasse. Era como se todos os dedos que estivessem apontados para outro lugar virassem, mirando o meu peito. Não eram eles que tds perseguiam, era a mim.

Com o tempo, aprendi a me defender com meu silêncio. Meu sorriso se foi com a minha voz. Aprendi a não me importar. Mas nunca, nunca adiantou, eu sempre me importei.

E sempre que faziam isso com outros, eu me virava. Não interferia, não fazia nada. Não conseguia ajudar, não queria que fossem para cima de mim, não queria pensar sobre isso. Tb não conseguia fazê-lo, era um sofrimento que eu não desejava a ninguém. Nessas horas eu simplesmente deixava de existir.

Eu tentei de todas as formas esquecer. Usava todas as estratégias que podia. Pensava que seria apenas uma fase, que logo td passaria. Criava paixões e até chegava a realmente acreditar nelas, afinal td já era tão confuso, isso não seria mais. Bolei planos HTs, construí sonhos HTs, quis me tornar HT.

A angústia só aumentou, a dor só aumentou. Inúmeras foram às vezes que chorei trancado no banheiro, no chuveiro ou debaixo dos cobertores.

E td isso pq desde pequeno eu já sabia que não era aceito, eu já sabia que não poderia ser quem eu fosse. Mesmo que eu me esforçasse para ser a melhor pessoa do mundo, não seria bom o suficiente para encobrir aquilo. E td isso pq eu amava diferente.

Pensei em terminar com td, acabar com essa vida. Queria que a dor terminasse.


Então vc que está lendo isso. Por favor, não faça isso com uma criança. Vc pode até pensar que ela não entende, que ela não vê. Mas ela sabe mto bem qdo não gostam dela.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Coisas que um hétero jamais entenderá - prefácio

Faz tempo que estava com vontade de postar algo nesse estilo.

Por alguma razão em todo esse tempo não tive vontade de postar, não tive vontade de me expressar pela escrita. Minha linguagem voltou-se para outro lado. Não queria estar em meio a palavras, a verbos, substantivos, pronomes, adjetivos. Quis estar no ser, no concreto.

Algo me faz retornar a esse velho conhecido. Possuo esse blog há mto tempo, sinceramente não sei desde qdo e sinceramente estou com preguiça de procurar. Mas isso não importa, o que venho a iniciar quer ser mais importante do que já se foi.

Começo essas linhas com um novo projeto: escrever sobre sentimentos gays. Acho que esse título não é dos melhores para explicar minha intenção. Espero que ele mude, que se transforme com o tempo, mas por enquanto deixemos que eles no leve a algum lugar, a um ponto de partida, a um fio.

Quero escrever sobre sentimentos que os nomeados heterossexuais parecem não entender, perceber. Sentimentos que nós, homossexuais e mais especificamente gays, sentimos, vivemos.

Em meio a tanta intolerância de nossos tempos, a tantos casos de discriminação e preconceito, espero que minha palavra possa levar conforto para alguns e sensibilidade para outros. Espero poder abrir uma fenda em certas atitudes e transformá-las em outras.

Talvez fosse isso o que faltava para eu escrever, expressar-me já não parece ser o que basta.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Descoberta

Não sei como, mas descobri uma forma de deixar meu blog antigo, esse mesmo e apenas mudar seu endereço.
Assim fiz. Tinha feito outro blog, deletei-o e deixe apenas este.
Que tudo volte a ser como era antes...

Só mudando o endereço...

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Textos antigos

Mais um texto antigo, um texto sem título. Acho que era melhor do que sou...


Ao nascer do sol
Um amor que floresce.
Ao anoitecer
Somente uma pétala.

Foge de mim
Entre caminhos ardilosos
Por ondas imensuráveis.
Não subsisto.

Ódio torna-se patente.
No entanto,
Ao som de sua existência,
Liberto-me à ilusão.

A tola esperança renasce.
Restaura a alma,
Armada para o próximo dia,
Mas não à próxima morte.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Andando de patins

Fui no parque Ibirapuera esses dias.
Estava sentado, esperando meu amigo, enquanto lia um livro. Ao mesmo tempo em que lia, acabava observando o que acontecia ao meu redor. Minha atenção fica dispersa em lugares públicos, cada barulho chama por ela.
Tentava me concentrar na leitura. O local ajudava, estava na frente do MAM, sentado perto da marquise em reforma. Um lugar geralmente movimentado, mas por conta da reforma havia poucas pessoas, pouca movimentação.
No meio de minha leitura, ouvi alguém falando alto. Parecia um pai brigando com um filho. Ao me voltar para o barulho encontro, acho que um pai e acho que uma filha.
A filha estava tentando aprender a andar de patins. Estava com todos os equipamentos de proteção possíveis, capacete, luva, cotoveleira, joelheira.
Seu pai caminhava ao seu lado. Parecia bravo, falava para ela fazer de um jeito, de outro. Até que um momento ela parou e disse:
"Acho melhor esperar o ...."
Pela sua forma de falar, imaginei que fosse um professor. Seu pai continuava a falar alto, dizia coisas como "não precisa", "aí vc já tá andando" e a puxava pelo braço para ela continuar a andar.
Dizendo assim, até parece que seu pai a estava incentivando, mas não a estava.
A menina não era pequena, era gde, deveria ter uns 17 anos ou mais. Era nítido o seu medo de sofrer uma queda. Seus braços e pernas estavam rígidos, parecia uma boneca sem articulações. Diversas foram as vezes que jogou os braços para frente, para evitar de bater o rosto, o peito caso caísse. Suas pernas estavam trêmulas, seu corpo pendia para frente e para trás e deslisava mais pelos puxões do pai, do que pelos seus próprios impulsos.
Seu pai continuava mandando-a andar e puxava seu braço. Falava para ela mexer as pernas, dar impulso, mexer o corpo, qq coisa.
A menina tentava, mas o medo parecia tomar conta de seu corpo.
A menina permanecia ali, sendo puxada pelo pai, sendo empurrada por ele. E eu continuava olhando. Eles continuaram assim, até se distanciarem de mim. Nada pareceu mudar aquela situação e sabe-se desde de quando estavam naquela dinâmica.
Pensei na menina, estava aparentemente tão equipada, cheia de proteções pelo corpo, não conseguiria pensar em mais um equipamento para ela. Mesmo assim, parecia estar com muito medo, com o corpo travado.
Pensei em seu pai, tão rígido, sério e nada amoroso com sua filha. Mas que mesmo assim deve ter comprado tudo isso para ela.
Pena que seu pai e talvez nem ela percebessem que a proteção que a menina mais precisasse não tinha, a proteção de seu pai.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Textos antigos

Revirando minhas coisas para participar de um livro que sairá produzido por homens gays achei uns textos antigos. Postarei alguns no blog. Aqui vai um que escrevi numa fase meio tensa da minha vida...


Sonho

Um dia sonhei.
Sonhei com um sol,
Um amanhã
Um novo.

Sonhei.
Não sei se de noite,
Ou de dia.

Só que neste sonho,
Não dormia,
Acordava.

Acordava num mundo diferente,
Era mais fácil te beijar, abraçar,
Te amar.
Era mais fácil viver.

Tive que voltar...
Voltar ao meu mundo,
Acordar nesse lugar.
Quis sonhar novamente.

Quando algo me disse:
“Deixa disso, menino,
Era apenas um sonho”

Ah...
Mas como era bom aquele sonho,
Que gostoso era sonhar.

E de novo se ouvia:
“Deixa disso, menino,
Era apenas um sonho”

E toda vez que te ouvia,
Toda vez que pensava,
Voltava a sonhar.

Ah...
Como era bom aquele sonho,
Que gostoso era sonhar.

E a voz foi diminuindo,
E aos poucos
Já nem se ouvia.

Mas o sonho ainda era meu
E foi na sua voz
Que ele se esvaneceu.

“Deixa disso, menino,
Era apenas um sonho”

Ah...
Como era bom aquele sonho,
Que gostoso que seria
Se ele juntos
Pudéssemos sonhar...

sábado, 14 de janeiro de 2012

Presente de Natal

Véspera de natal.

Um menino esperava ansiosamente para sua hora de dormir. Queria dormir logo, queria que o dia seguinte chegasse logo. Tinha pedido para o Papai Noel um presente novo e esse seria o melhor presente que poderia ganhar.

Enquanto sua mãe o colocava na cama, a única coisa que ele pensava era no presente.

“Mãe, é verdade que o Papai Noel pode dar qualquer presente?”

Sua mãe não lhe respondeu, apenas fez outra pergunta:

“Mas o que vc pediu esse ano que está com tanta vontade de ganhar?”

“Não posso contar mãe… é segredo…” - Dizia ele baixinho.

Sua mãe sorriu. Pensava na bicicleta que tinham comprado para ele. Tinha certeza que era aquilo e que seu filho ficaria muito feliz. Falou tanto na bicicleta durante o ano, só poderia ser aquilo. Não tinha sido fácil comprá-la, mas por ele, queria fazer aquele sacrifício.

“Durma bem meu filho. Vamos dormir rapidinho que assim amanhã chega mais rápido” - Deu um beijo no menino e saiu do quarto.

No meio da noite seus pais levantaram para colocar o presente na árvore. A mãe contava para o pai do menino sobre sua conversa. Os dois riam baixinho enquanto arrumavam o presente. Eles também estavam felizes e ansiosos com o dia.

Na manhã seguinte a mãe foi acordar o menino e encontrou-o parado em frente ao espelho.

“O que vc está fazendo, filho?”

O menino não tinha percebido sua mãe entrar. Respondeu que não era nada, abaixou a cabeça e foi para a sala.

Sua mãe achava estranho. Pensava que algo tinha acontecido, o menino não parecia bem, parecia triste.

Foi para a sala atrás dele.

Os dois abriram o presente juntos. O menino sabia que ganharia uma bicicleta. Tinha visto seus pais escondê-la, tinha ouvido eles colocarem na sala. Fingiu estar surpreso e muito feliz. Fez uma festa grande com seus pais, dizia que queria andar nela agora e saiu pela rua. Seu pai o acompanhava para ensiná-lo. Sua mãe ficara mais aliviada. Ainda ficou com a imagem de seu filho olhando para o espelho na cabeça, mas pensou que deveria ser alguma coisa de criança. Quem sabe seu filho não estava querendo crescer, afinal ele era um dos mais baixos de sua turma.

O menino brincava na rua com o pai. Tentava andar na bicicleta, mas caía muito. Em um momento o menino teve um tombo forte. Ralou a perna e a mão e começou a chorar. Seu pai tentou acalmá-lo, mas não conseguia. Resolveu levá-lo para dentro de casa.

Sua mãe também apareceu para acalmá-lo, mas o menino não parava de chorar. Fizeram um curativo e colocaram-no um pouco na cama para ver se sentia melhor. Sua mãe fazia um cafuné e dizia que isso acontecia quando as pessoas estavam aprendendo a andar de bicicleta, mas que ele não podia desistir, tinha que ser forte, já estava grandinho, não podia chorar daquele jeito.

O menino fingia escutá-la, fingia se acalmar com aquilo. Mas o que o acalmava era apenas o colo e o carinho de sua mãe. Não chorava pela sua perna, pela sua mão. O tombo nem doera tanto, lembrava de que quando tinha quebrado o braço, a dor tinha sido muito pior. Chorava por outro motivo. Chorava, pois pensava no seu presente.

Não sabia porque tinha pedido aquilo. Nem acreditava em Papai Noel, sabia que ele não existia. Já era esperto o suficiente para entender como o natal funcionava. Mas seu desejo não o deixava em paz. Suas esperanças ainda o faziam sonhar com seu presente. E nada parecia ter mudado.

Seus pais deixaram-no descansar um pouco na cama. O menino, sozinho no quarto, permanecia deitado de lado, com o corpo voltado para a parede. Agarrava o travesseiro, apertava-o fortemente com as mãos e aproximava-o do peito. Seu coração doía, parecia queimar, parecia derreter. Fechava a abria o olhos lentamente. Seu olhar fixava-se em suas sensações, olhava para dentro, olhava para si. E entre olhadas e piscadas, algumas lágrimas escapavam de seu coração. Ele era apertado, esmagado, contraído. Ouvia-o bater, tentava calá-lo. Dizia para si - Fica quieto, eu não quero mais. Mas ele continuava a pulsar desejos.

E num deslize, uma lembrança escapou. Lembrava de alguns dias atrás. Sentado ao lado de seu amigo. Seu ombro encostava no dele, parecia vivo com o toque. Lembrava do sorriso dele, sem um dente, como o seu. Lembrava de seus olhos, castanhos e amorosos, com longos cílios. Lembrou de seu amigo abaixar e inclinar sua cabeça, encostando em seu ombro e parando ali. Lembrou do tempo parar, de seu coração pular. Permaneceu parado por não sabe quanto tempo. Não conseguia mexer. Sentia apenas sua respiração ficar mais ofegante e um peso em seu ombro. Um peso que no momento foi leve, macio, que atravessou seu ombro e percorreu seu corpo. Calentou-o, aqueceu-o, sentiu-se diferente, não lembrava de uma sensação tão boa.

No entanto, com o passar dos dias, seu peso aumentou. Tornou-se áspero, difícil de carregar. Pinicava-o, tornou-se incômodo. Sentia que aquele peso poderia esmagá-lo a qualquer momento. Não, não podia. Não podia sentir-se bem.

Queria que aquele peso passasse, queria que ele nunca tivesse acontecido.

Queria mudar para sempre.

O espelho parecia delatá-lo e rir de sua cara.

Ainda era o mesmo… e ainda carregava aquele peso…